O mercado internacional da soja parece estar se consolidando em um novo cenário de preços. Os especialistas, no entanto, ainda sugerem que os fatores que levaram às cotações ao patamar dos US$ 9,00 por bushel na Bolsa de Chicago sejam acompanhados de perto e confirmada sua influência.
Nos primeiros 23 dias de março, os contratos maio/16, referência para a safra brasileira, e agosto/16 subiram, respectivamente, 5,51% e 5,57%, para US$ 9,05 e US$ 9,14 por bushel. Os ganhos expressivos, segundo explicam analistas, reflete uma volta dos fundos de investimento ao mercado da soja após meses atuando nas margens à espera de novidades. Uma junção de fatores passou a atuar sobre os preços e renovou seus ânimos.
Nova safra dos Estados Unidos
A nova safra de grãos dos Estados Unidos começa nas próximas semanas e se intensifica, portanto, a influência do chamado “weather market” (ou mercado climático) sobre os negócios em Chicago a partir desse momento. Na medida em que os trabalhos preparativos de campo ganham mais ritmo, os preços se consolidam em um novo quadro. Afinal, uma nova fase se inicia, com perspectivas e dados novos.
E as projeção para este novo ano safra indicam, primariamente, uma redução da área de soja e um aumento da de milho no país. No último dia 18, a consultoria Informa Economics reduziu, em relação aos números de janeiro, a área esperada para o cultivo com a oleaginosa – de 34,49 milhões para 33,9 milhões de hectares – enquanto aumento sua projeção para o milho – de 35,96 milhões para 36,22 milhões de hectares.
Os preços mais baixos das commodities dificultaram as decisões dos produtores norte-americanos. Porém, as movimentações recentes dos produtores para o início da nova safra também reforçam a indicação desta possibilidade de uma área menor de soja, como explica o consultor de mercado Vlamir Brandalizze, da Brandalizze Consulting.
“Temos um movimento de compra de insumos nos últimos dias, com a movimentação para milho, aparentemente maior, ou seja, o produtor está buscando um volume de sementes maior do que ele plantou no ano passado. O USDA vai confirmar os primeiros números no final do mês. Já na casa da soja, há uma retenção do produtor, ou seja, busca menos insumos com dois indicativos: tende a reduzir a tecnologia empregada, ao mesmo tempo que dá sinais de uma área menor”, diz. “Quando os produtos estão baixos, onde a margem quase não existe, o produtor prefere o milho, que tem um potencial produtivo maior nos EUA”, completa.
Sobre o clima, os analistas afirmam que ainda é cedo para saber quais condições que a nova safra norte-americana deve enfrentar. No entanto, a maior dúvida que se tem neste momento é se o El Niño, que foi um dos mais fortes da história, vai se desenvolver para um La Niña ou se o clima volta a atuar com neutralidade.
Neste momento, a cultura que mais sente esse fundamento é o trigo. Uma nova e forte fria chegou aos Estados Unidos nesta semana e uma redução drástica das temperaturas ameaça severamente o potencial da safra de inverno do país. A notícia entrou no radar dos investidores, puxou os preços do cereal e, consequentemente, deu suporte ao milho e, na sequência, à soja. Os futuros do trigo, em Chicago, já subiram, só em março, mais de 4%.
América do Sul
Na América do Sul, a safra 2015/16 está em sua fase de conclusão. No Brasil, após problemas pontuais originados por condições adversas de clima e perdas expressivas em regiões como o Matopiba, a colheita passa de 60% no país, e a previsão é de que a safra nacional chegue aos 100 milhões de toneladas.
Entretanto, os negócios internos estão travados, após os produtores já terem comercializado mais de 60% de sua produção e agora contarem com referências de preços mais baixas, principalmente em função de uma queda recente do dólar frente ao real.
Na Argentina, segundo as últimas informações da Bolsa de Cereales, a colheita chega a apenas 1% da área e mostra atraso de 2,9 pontos percentuais em relação ao mesmo período do ano anterior. O país, de acordo com projeções internacionais, deverá colher cerca de 60 milhões de toneladas.
Na nação vizinha ao Brasil, entretanto, a mudança política e as novas medidas tomadas pelo presidente Maurício Macri são o que mais chamam a atenção e ganham os olhos dos investidores no mercado internacional. Macri reduziu a taxação sobre as vendas externas da oleaginosa, com um objetivo ainda maior no programa de exportações do farelo de soja.
Nesta semana, inclusive, um navio com 25 mil toneladas de farelo de soja argentino foi direcionado aos Estados Unidos e, “apesar do pequeno volume, isso confirma a falta de competitividade do produto norte-americano”, ainda de acordo com analistas da Agrinvest. E “os baixos custos de frete marítimos, graças aos itens energéticos também, mais baratos, fez do farelo argentino uma boa opção para a costa leste americana”, explica Ted Seifried, estrategista chefe da internacional Zaner Ag Hedge Group.
Óleo de Palma
Outra safra que vem chamando a atenção do mercado internacional da soja é a de Palma no principal produtor global, a Malásia, e a preocupação se estende para também para a Indonésia. Sentindo os efeitos do El Niño, a safra de ambos os países caíram por duas temporadas consecutivas e reduziram a oferta do óleo de palma, elevando os preços nos mercados internacionais, puxando, portanto, as cotações ainda do óleo de soja.
Nos últimos dias, os futuros do óleo de palma chegaram a registrar, na Malásia, suas máximas em 24 meses e, somente em 2016, têm uma alta acumulada de 8%, segundo relataram analistas de mercado da Agrinvest Commodities. Entretanto, a commodity, no final desta semana, passou por um ligeiro movimento de realização de lucros, apesar de fundamentos ainda altistas.
Demanda da China
Sobre a China, as incertezas ainda permeiam as projeções das importações deste ano comercial. Os temores sobre uma possível redução da atividade econômica ainda existem e seguem atraindo as atenções dos investidores, no entanto, segundo a maior parte dos analistas nacionais e internacionais, acredita que esse quadro, caso se confirme, não deverá afetar a demanda por alimentos, reduzindo as compras da nação asiática, principalmente, da oleaginosa.
E para a temporada 2016/17, a projeção do adido USDA (Departamento de Agricultura dos Estados Unidos) em Pequim é de um novo recorde para as importações chinesas de soja, as quais poderiam chegar a 84,5 milhões de toneladas. “As importações de soja deverão seguir nessa forte tendência ascendente, com uma demanda ainda forte por parte dos exportadores, cujas margens de lucros melhoraram, ligeiramente, após nove meses consecutivos de declínio”, informou a nota do adido.
O acompanhamento, no etanto, também é necessário nesta frente. Nesta semana, a China fez o movimento chamado de “washout”, ou uma troca de destino, com alguns carregamentos de soja do Brasil e movimentou o mercado internacional. “Não existe um cancelamento (…) Seriam embarques que a China não teria interesse em fazer e teria recomprado”, explica a analista de mercado Andrea Cordeiro, da Labhoro Corretora.
A movimentação, entretanto, é comum no mercado internacional. Afinal, ainda de acordo com analistas, esses volumes poderiam ser recomprados mais adiante e talvez até de outras origens, como os Estados Unidos, por exemplo. No entanto, caso isso continue a acontecer e ganhe mais força, deve tomar a atenção dos traders e poderia pesar sobre os preços em Chicago.
Taxa de Câmbio
A movimentação do dólar – no Brasil frente ao real e no cenário exterior frente a uma cesta de principais moedas – também foi um fator determinante para um avanço das cotações em Chicago nas últimas sessões. Com a moeda norte-americana se desvalorizando frente à brasileira, o produto nacional perdeu sua competitividade e levou os compradores a encontrarem melhores oportunidades de compra no mercado norte-americano.
Do dia 1º ao dia 23 de março, somente, o dólar comercial recuou de R$ 3,9411 para R$ 3,6768, uma baixa acumulada de 6,71%, que elevou a demanda internacional pela soja dos EUA. Assim, os produtores locais voltaram a participar do mercado com novas vendas, porém, ainda de forma comedida. Por outro lado, o movimento afastou ainda mais os vendedores brasileiros.
Internamente, a cena política – que continua sendo nitroglicerina pura – está no foco dos negócios, porém, ainda permitindo inúmeras leituras não só dos especialistas, mas do mercado em si e dos seus investidores. A tendência, portanto, ainda é de extrema volatilidade para o dólar frente ao real.
Petróleo
O mercado internacional do petróleo também mostrou intensa volatilidade nesta semana e influenciou, diretamente, nas cotações da soja negociadas na Bolsa de Chicago. Nos últimos dias, as variações na Bolsa de Nova York variavam entre 3% e 4%, para altas ou baixas, e na CBOT, a oleaginosa respondia imediatamente.
Em fevereiro, a commodity chegou a operar, em Nova York, com preços de US$ 26,00 por barril. Na sequência, porém, testou uma recuperação ao voltar para a casa dos US$ 40,00 por barril. A boa notícia, portanto, segundo Daniel Brusstar, diretor de Combustíveis no CME Group (Chicago Mercantile Exchange) ao Infomoney, é que aqueles US$ 26 são passado e a tendência do petróleo é continuar em alta.
“Esperamos que a queda do petróleo tenha chegado ao fundo [em fevereiro] e que agora a Opep (Organização dos Países Exportadores de Petróleo) chegue a um acordo”, afirma.
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Zika vírus no Brasil
Sim, até a extrema preocupação de todo o Brasil com o Zika vírus chegou ao mercado internacional da soja. Rumores dos últimos dias mostraram que os tais “washouts” realizados pela China com carregamentos de soja brasileira poderiam ter sido feitos, em função também do Zika. Os importadores estariam bastante preocupados com os atrasos dos embarques nos portos brasileiros e temendo a contaminação dos navios.
Segundo noticiou o portal internacional Agrimoney, “os rumores sinalizam ainda uma imposição por parte da China de uma restrição fitossanitária para evitar a importação do vírus, que é endêmica no Brasil, mas não em países concorrentes na exportação de soja, como os Estados Unidos, por exemplo”.
Por: Carla Mendes
Fonte: Notícias Agrícolas